terça-feira, 7 de janeiro de 2014
Lettre d'Amour 2ª temporada (9)
Prezadas Hélenè e Charlotte,
Isabelle e eu estamos profundamente decepcionadas com tudo isso. Sim, violei sua correspondência, sob os protestos de Belle, com o propósito de compreender e ajudar Marion.
Primeiro não é possível concordar com a mera coadjuvância à qual nos querem relegar. Excluam-nos e sobrevivam, se puderem. Depois, esses anos todos de mentira. Orgulham-se disso, Senhoras?
Quando Madame Charlotte e a Pequena Marion voltaram daquela viagem torta, achávamos que o estado em que se encontrava a Pequena fosse consequência de tanto se ocupar em defender Charllote da própria loucura. Charlotte, você pesa demasiado. Então as recebemos de volta e cuidamos para lhe devolver a dignidade, Charlotte. Sua saúde física, seu espírito mais ou menos nos eixos e você estaria novamente pronta para suas aventuras. Você se colocou na frente de Marion que, dia após dia recuperava ou camuflava as feições sob inquestionável doçura.
Então arrastaste Marion para o precipício e depois de ela quase morrer, nos fez crer que aquilo tudo nem era tanto assim, tomando para si todas as atenções e cuidados? E ainda posa de melhor companheira da Pequena? Você é um verme, Charlotte.
E você, Hélenè, com sua aparente lucidez, seu discurso reto, sua conduta madura, moralmente respeitável, uma farça. Falsa!
Saibam que meus poetas mortos, aos quais devem muito de sua inspiração, me ensinaram a ler dentro. E dentro de você, Hélenè, é Heiner Müller quem me diz, habita uma serpente. Papel que lhe cairia com perfeição, se você tivesse algum talento: a Marquesa de Merteuil. Enquanto Marion, ofélica, agoniza. Nelson Rodrigues me sopra neste instante que muitas vezes, em vez de Marion, você mesma desfrutava da felicidade destinada a Charlotte. "Batata!", sentencia.
Senhoras, afastem-se, se guardam algum vestígio de legítima compaixão. Cuido eu de Marion neste momento, segura de que o que vocês atraem, ou pelo qual se sentem atraídas, não deve merecer empenho.
Isabelle trabalha, e muito, garantindo a credibilidade que você, Charlotte, com seus arroubos vulgares, muitas vezes põe em risco. Para que você desfrute de seu ilusório protagonismo, Isabelle trabalha.
O seu egoísmo, Charlotte, e a sua hipocrisia, Hélenè, nos envergonham. Se aproveitam da sensibilidade exacerbada de Marion, desfrutam de sua intensidade, para depois a atiraem num canto da cozinha quando a experiência toma rumos que ameacem suas confortáveis escolhas.
Peço-lhes encarecidamente realizarem o esforço de se afastarem, refletirem e se apresentarem de volta quando puderem compreender o mal que resulta de seu estufadíssimo ego.
Agradecemos desde já a necessária compreensão.
Catherine
(Por Ceronha Pontes)
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