quinta-feira, 17 de julho de 2014

Como Água para Chocolate - receitas em verso e prosa


CAPÍTULO IX

Nhoque de Inhame
(Celebração à Amizade)

Sim, amigo é coisa muito cara, mas na minha vida tenho o imenso privilégio de que não seja rara. Os tenho aos montes. E são os melhores do mundo.
Nesta série eu não poderia deixar de homenageá-los, elegendo um prato que é a especialidade de um deles, e que tenho como se meu irmão fosse. Sintam-se os outros todos representados porque neste momento ofereço um pouco desta delícia a cada um, desde Tamboril até Cuzco, onde fiz os mais recentes.
Venham comigo ao Edifício Fortaleza, 502, lá na Duque de Caxias, centrão de Fortaleza. A porta da cozinha deve estar aberta, é só entrar. A esta altura o Eddie já voltou pro Recife. Este de cueca vermelha rodopiando pelo corredor é o Pedro. As crianças (Iago e Juan) brincam. Marta deve estar na rádio comandando seu programa Por uma cultura de paz e, fazendo experimentos vocais no banho, está o nosso chef Danilo. Eu sou a da cara emburrada que mora no quarto do meio. Visitas aos montes em todas as horas do dia, principalmente da noite. Todos artistas. Intensos criadores. Meus deuses, como fomos felizes! E antes que eu desande a chorar, porque os dias não estão fáceis, e reviver aquela algazarra me emocionaria demais da conta, vamos ao nhoque.


Acho que até hoje o Danilo reúne o povo no fim do mês com fé de que este prato traga um dinheirinho a mais para todos. A verdade é que nenhum de nós enricou, mas somos a fortuna uns dos outros e isso não tem dinheiro que compre.


O nhoque do Dan é de batata mesmo, convencional e delicioso. Ele aprendeu num programa de TV com a saudosa Nair Belo. Não sei se ele lembrava disso, mas eu estou aqui para reavivar sua memória. Enquanto eu, seguindo as orientações da Bela Gil, que faz inquestionável defesa do uso do inhame na dieta, o adotei. Então, em homenagem a todos os meus amigos, em especial ao mestre cuca Danilo Pinho, que introduziu este hábito de nos reunirmos em torno desta massa que promete prosperidade, lhes ofereço o meu nhoque de inhame, com molho natural de tomate com manjericão.
Duas xícaras de chá de inhame bem cozido e espremido. Uma gema sem pele, três colheres de sopa de manteiga ou margarina, sal a gosto. Mais ou menos uma xícara de chá de farinha de trigo. Misture os ingredientes numa tigela, adicionando só a metade da farinha. Espalhe sobre a mesa um pouco da outra metade restante, para que você possa trabalhar sem grudar, e vá adicionando o resto aos pouquinhos, até que ganhe uma consistência que lhe permita fazer os rolinhos e cortá-los como nas imagens. Se precisar de mais farinha para isso, fique à vontade. Para cozinhá-los, leve ao fogo uma panela com bastante água e um fio de óleo. Depois de ferver, vá colocando os rolinhos um pouco por vez. Eles, é claro, começam o cozimento afundando na panela, mas, quando chegam ao ponto, flutuam. Retire-os e repita o procedimento até que todos estejam cozidos. É bem rápido.
                       
                                

Sempre prefiro molho natural e o meu preparo com dez tomates daqueles mais compridinhos e bem maduros. Corte-os com semente e pele mesmo, coloque no liquidificador aos poucos até que esteja tudo batido. Peneire. Numa panela grande adicione quatro colheres de sopa de azeite de oliva extra-virgem. Aqueça. Refogue três dentes de alho picados. Quando dourarem, adicione uma cebola média picada e alho poró a seu gosto e refogue mais. Adicione então a polpa de tomates já peneirada, uma colher de sobremesa de açúcar (para quebrar a acidez), três colheres de sopa de molho shoyu, sal a gosto, um pouquinho de cheiro verde (coentro e cebolinha), dez azeitonas verdes picadas e muuuuito manjericão. Deixe cozinhar em fogo baixo e sem pressa. Até reduzir ou apurar bem, ganhando aquele vermelho tentador.


Nhoque no prato, coberto com este delicioso molho e finalizado com parmesão de verdade, ralado grosso.
Esta receita serve três, mas você pode ir multiplicando por quantos vierem celebrar com você esta riqueza que é a amizade. Ao multiplicar, claro que você vai achar o momento de reduzir a manteiga e as gemas. Já lhe disse mais de uma vez que cozinha é sensibilidade e nada melhor que os amigos para nos ajudarem com isso.


É prato simples. E a simplicidade é mesmo sofisticada. Sofisticação é uma palavra que o Danilo adora e tem tudo a ver com ele, em tudo o que ele faça. Danilo e todos os moradores e visitantes daquele 502, como eu amo vocês!
A vocês e a todos os meus outros amigos, com profunda gratidão, desejo bom proveito.

Ceronha Pontes

Extra: uma canção do Petrúcio Maia e do Belchior pra vocês, cujas lembranças me salvam mais do que vocês possam supor. Incêndio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário