quarta-feira, 30 de outubro de 2013

O ABANDONO




Primeira vez que a encontrei ela se apresentou como Sakuntala.  Que artista teria feito aquilo?  Esculpido de tal maneira O Abandono? Eu me perguntava, arrebatada.
CAMILLE CLAUDEL.
Depois daquela visão eu não podia mais esquecê-la, nem me conformar com a pouca informação de que teria sido amante do mais aclamado escultor francês.
Levei anos procurando-a na França da época, no que haviam escrito sobre ela, no que havia escrito ela própria. Sobretudo, procurei por ela em cada uma de suas esculturas. E porque era inevitável, encontrei-a também na obra e trajetória de Auguste Rodin.
A devoção ao Belo somou-se à indignação e logo não havia como recuar deste compromisso de fazer ecoar o seu clamor:
“Exijo em altos brados a minha liberdade”.
Não pude ficar indiferente. Minhas mãos também doíam de vontade esculpir. Mas não herdei o dom de minha Mãe. A ela devo talvez a capacidade de me afetar com A Implorante e a história de sua criadora. Então, sem qualquer habilidade para enfrentar o mármore, ou mesmo um bocado de barro, ofereço minha própria carne com toda a humildade de que sou capaz.
Tornou-se urgência também minha denunciar a necessidade de abafar, destruir, banir aqueles que por algum atrevimento da natureza, vieram selvagens, rebeldes, vibrantes, dotados de uma força criativa absolutamente imprevisível. A violência com que a mediocridade atirou-se sobre um espírito livre e revolucionário que ousou instalar-se num corpo de mulher.
A peça estreou em março de 2006, em Fortaleza-Ce. Foram muitas as apresentações durante um ano e meio, até que a vida se impôs de maneira a nos afastar por seis anos.
Em 2013, aconteceu de o Visões Coletivas/Nordeste Contemporâneo, projeto de ocupação do Teatro Glauce Rocha no Rio de Janeiro, pelo Coletivo Angu de Teatro e a Atos Produções Artísticas (Recife-Pe), me convocar a resgatar este trabalho. A coincidência é que justamente em 2013 completam cem anos da internação e os setenta anos da morte de Camille Claudel. 
Desde então renovado o compromisso de empenhar nossos dons para que Camille não seja lembrada simplesmente como a amante de Rodin, ou a irmã de Paul Claudel, muito menos como uma alienada, mas, como a grande e revolucionária artista que ela foi. Deste modo esperamos também chamar a atenção para outros tantos que, assim como ela, foram despojados de seu gênio e tiveram suas vidas perversamente interrompidas.
Você se calaria? Eu também não.

Ceronha Pontes

CAMILLE CLAUDEL
Teatro Eva Herz, Livraria Cultura do Shopping RioMar (Recife-Pe)
De 08 de novembro a 08 de dezembro
Sexas e sábados às 20h
Domingos às 19h
Ingressos: 40 e 20 (meia entrada)

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