segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

AMARELA II



- Ao contrário do que dizem, ela tem vida breve. 
Surge líquida, transparente. Promessa de te matar as sedes todas.Mas justamente quando ela vem, é que falta pouco e você vai precisar de calma. Calma pra entender o movimento e livrar-se, um a um, de todos os melindres, no tempo que restar. Acolher o luto.
Líquida, não esqueça. Sentiu molhar, observe, observe, observe...
Vai ficando espessa, ganhando uma cor esbranquiçada, opaca. Neste momento é comum se desequilibrar um tanto, praguejar, mas, se você entendeu não se desgaste. Só mais um pouco e é já o fundo. Aí sim, momento de se encolher e chorar. É justo. 

Tempo.

- Repare, é agora. Aspecto emborrachado. Pronto, amarelou. Morre assim, a Esperança: amarela.

Pesado silêncio.


- O que vem depois é vermelho, mas já tem outro nome.

...

Ceronha Pontes
Recife-Pe, 28 de janeiro de 2013.

Para ler AMARELA I




domingo, 27 de janeiro de 2013

MÃE E FILHO (Dois Perdidos)



Ele se achando no direito de ser cruz. Ela se achando no dever de carregar.

Cecé
Recife-Pe, 27 de janeiro de 2013 


sábado, 26 de janeiro de 2013

PEDAÇOS DE VIDRO



Foi ela, Margarida, a Paixão. Aí não sobrou do que fizessem civilizado "bom dia". 
Impetuosa, vive do que inventam os seus olhos coloridos e que, invariavelmente, lhe sirva ao prazer. Ao próprio e breve prazer. 
Foi a porra da Paixão, Margarida.
E pensar que seria uma linda Amizade...

Ceronha Pontes
26 de janeiro de 2013

sábado, 19 de janeiro de 2013

Padecendo no Paraíso


Filhos a mais, a desgraçada. Queria ser a Mãe de um só. Aquele. Fosse o seu adorado primeiro e único.
Eis que a vida (o marido?) lhe impôs dois adotivos e mais aquela outra, a pior de todos pois, sua de sangue, mas não de idéias.

Ceronha Pontes
Recife-PE, 19 de janeiro de 2013



sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

CURTAS



MAGRA
Amiga minha disse que finalmente reconheceu e adotou regime infalível: a Mãe.
É ligar pelo menos uma vez ao dia para a Mãe que em coisa de semana ou duas os quilos a mais se vão.
Trata-se de uma mulher tão, mas, tão amarga, que derruba apetite até do Cão.

OTIMISTA
Cheinha de Fé, a boneca de pano que já vem com a velinha apagada:
- Desisto. Entrego tudo pra Deus.
Estragaprazeresinhos responde:
- Deus não existe.

INVERTIDA
Menina pequena lá dos Inhamuns ouvia a Mãe repetir ditados cuja aspereza, nem em boca de Madrasta. O que mais confundia a pequena era assim: "Filho quando perde o Pai, perde SÓ o Pai. Quando perde a Mãe, perde TAMBÉM o Pai".
Lhe pareceria ainda mais estranho quando da morte de seu Pai.
Crescida, concluiria que teve um Pai que era uma Mãe.

DIVERTIDA
- KKKKKKK!!!!!

ETC.

Ceronha Pontes
Recife-PE, 18 de janeiro de 2013

domingo, 13 de janeiro de 2013

CONCEPÇÃO II



Assombrados pela dúvida, Pai e Filho não chegaram a ser.
Desnecessário, o Espírito Santo partiu que não deixou endereço. 
A Mãe derramará seu pranto coadjuvante ad infinitum.

Ceronha Pontes
13 de janeiro de 2013

Para ler CONCEPÇÃO I.


terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Eu sem você...


Ele, num cômodo distante, com a mão na "agulha":

- Céééé, a gente tinha mesmo quantos aaanos?
- Vinte e trêêês.
- E agooora?
- Beirando os quarenta e uuuuum.
- Eita, minha filha, que você me deu os melhores anos de sua viiiida.
- E quem te disse que os anos que eu te dei foram os melhoooores?
- Bufo! Pois escute esta que Nãoseiquemzim oferece a um alguém das iniciais C-A-P-O e só não diz o nome pra não fazer confusãããão.
- Maaaaanda!!!




Ceronha Araújo Pontes de Oliveira
Recife- Pe, 07 de janeiro de 2013

domingo, 6 de janeiro de 2013

Reencontro



Exatamente como reencontrar um grande amor, pelejo para reaprendê-la. 
Carregada de tudo quanto acumulei na distância, chego ansiosa, pesada, ruidosa, dura, um desastre! 
Com a sutileza de uma britadeira avanço sobre sua frágil figura. Atravessamos a crosta. Estamos exaustas.
Aqui, nas camadas mais finas, ela se compadece e me confia o cinzel com o qual entalhar minha própria carne. Generosa e pacientemente, vai me ensinando toda a intensidade, toda a beleza que há no molto pianissimo.

Ceronha 





                                                         Foto: Fernanda Oliveira

Após seis anos da apresentação de despedida do Ceará, no palco do Thetaro José de Alencar, CAMILLE CLAUDEL, um espetáculo de Ceronha Pontes, tem reestreia prevista para março, no Teatro Glauce Rocha, Rio de Janeiro.


quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Ao futuro, Dolores.


Primeiro almoço do ano.
Ouviam Dolores Duran. Não que estivessem tristes, muito pelo contrário. A tristeza, por Dolores metamorfoseada em beleza, era perfeitamente adequada ao instante.
A mesa estava bonita, ainda enfeitada com as flores da véspera. A comidinha suave sugeria delicadezas. Bebiam naquelas taças enormes, que são a predileção dela. O mundo parecia em paz. Vez em quando davam-se brevemente as mãos. Preferindo isto a falar.
Foi assim até que os versos de Castigo arrancaram dela um risinho e um suspiro, não sei exatamente se de malícia ou sabedoria, e então precisou do verbo.

ELA- "Eu tive orgulho e tenho por castigo, a vida inteira pra me arrepender". Era assim que se fazia música. A gente vem piorando, meu bem. 

Dolores segue:

"Se eu soubesse
Naquele dia o que sei agora,
Eu não seria esta mulher que chora,
Eu não teria perdido você".

Ela ri de novo. Desta vez um riso escancarado, seguido pelo dele.

ELE- E pensar que isto já foi popular.
ELA- O popular do presente não permitirá ao futuro reunir pessoas em ambiente tão delicado. Medo grande do que virá desse tchu, tchá, tchá. Nunca te cales, oh, Dolores!

Próxima faixa: Ternura Antiga.

Ceronha Pontes
Recife-PE, 03 de janeiro de 2013