Crio fantasmas. Recolhi-os ao acaso de minha perdição. Insuspeitáveis. Há os que me acompanham passo a passo, seja pra onde for, sob sol e chuva, sob riso e dor. E os que só vêm ter comigo no escuro. Fiéis, no entanto, estes e aqueles. São de diferentes raças e tempos e lugares e sua convivência nem sempre harmoniosa às vezes me adoece, outras diverte. Numa noite inquieta mais recente, reuniu-se a eles uma Delmira, uruguaya, que assim se apresentou:
"Fiera de amor, yo sufro hambre de corazones."
E desde então não se cansa de atirar-me à face a minha própria fome. Fez-se logo aliada de um outro insolente, um tipo estranho que se veste só da cintura para cima, pelo qual confesso minha predileção, pois sua natureza lhe permite surgir no modo "carne viva" quando queira. E o quer muito raramente, tornando inesquecível cada vez perdida que o faça, me dando de imaginar por mais não sei quantas encarnações. Juntos, Delmira e este outro, têm me enfeitado a janela com girassóis dourados. Por eles, nem importando se durmo, me gusta amanhecer.
CERONHA PONTES
Recife-PE, 20 de abril de 2010.
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