"Meu amor!
Disciplina é liberdade
Compaixão é fortaleza
Ter bondade é ter coragem."
(Há tempos, Renato Russo.)
Blogueiros queridos meus, celebrando a estréia da jovem escritora tamborilense Noélia Melo, que acrescenta à literatura infantil o seu
História de Circo, lançado amanhã na Bienal do Livro, em Fortaleza-CE.
Nascida pras rodas de poesia, cirandas e cantorias, Noélia é assim que nem uma colherada de doce-de-leite com um "pedacim" de queijo-qualho, que nem siriguela colhida vermelha no pé, que nem um "tibungo" no Pedra-e-Cal, que nem palestrar na pracinha de tarde pra noitinha. É uma jóia, a danada! Pode crer.
Como aconteceu?
A ONG Casa do Conto, criada por escritores e contadores interessados em contribuir para a inclusão social pelos caminhos da leitura, além de trabalhar com jovens da periferia de Fortaleza, propagou-se pelo interior do estado do Ceará, através de parcerias com as prefeituras interessadas. Assim chegou a Tamboril, onde o Secretário de Educação, o Sr. Gilson Mota, reuniu pessoas afinadas com a idéia (Fatinha, Weksslei, Isabel, Noélia e outros bons) e delegou-lhes a dulcíssima tarefa de resgatar o "gostim" das antigas tradições. Pois é certo que lá nos anos de antigamente, em tempos de farta colheita, o povo do sertão se juntava em mutirão e varava noites nos terreiros a debulhar feijão e lendas.
Orientado pelos técnicos da Casa do Conto, nosso bando contador deu com o espanador na poeira de baús sortidos como os de Sitônio Pedro, de Lourival e Totonha, também o de Graças Farias e de quem muito tivesse pra contar. Mistérios do Feiticeiro, assombros da Boca-da Noite, ou de como nasceu ali aquele tambor pequeno, aquele pé de Tamboril. Hômi, Seu Menino, a coisa rendeu!
Saraus bem animados com viola e cantoria, rodas de leitura em torno da foqueirinha, oficinas de contação e musicalização avançaram pelas escolas, despertando na meninada o gosto pelo trancoso e pela verdade também. Referências, horizontes, rebuliço criativo! Isto sim, um poder que nos convém.
Foi quando o Almir Mota, escritor e presidente da Casa do Conto, e também responsável pelo programa de contação de histórias do Centro Cultural Banco do Nordeste(Fortaleza), promoveu uma maratona de contação envolvendo os municípios contemplados com o projeto. A coisa se deu lá mesmo no auditório do CCBNB, na capital.
O tema era O CIRCO.
"Aí eu tive a inspiração" , revelou nossa menina, sobre a sua ficção. Escreveu sobre um circo que visitava a cidade todos os anos. Na ocasião a professora Ritinha (o nome seria uma homenagem à nossa Tia Ritinha?) levava a garotada a pesquisar sobre o tema e montava na sala de aula uma colorida exposição de desenhos e histórias de circo. Daquela vez, quem contasse a história mais divertida ganharia cobiçados ingressos para a matinê, que seriam entregues pelos próprios palhaços ali mesmo, na escola. A novidade assanhou a garotada que ansiosa esperava a visita de Pipoco e Pipoca. Atrapalhados e achando muito difícil escolher entre tantas engraçadas historinhas, os bons palhaços decidiram por convidar a turma todinha.
Pois eu é que não vou contar o resto da história. Só digo que tem trapezista bonita deixando Joãozinho de queixo caído.
Continuando:
Seu Menino e Dona Menina, os senhores me acreditam que depois de muitos livros pesquisar, o bando dos contadores escolheu para apresentar na maratona a história(então inédita) da Noélia? Contaram e deu o maior pé. Sucesso absoluto! Não tô dizendo? Assim foi.
Querem mais? Pois tem.
O Kelsen Bravos, também da ONG Casa do Conto, inscreveu História de Circo num edital da Secretaria de Educação do Estado, para fins de publicação que integraria a coleção Prosa e Poesia, do PAIC(Programa de Alfabetização na Idade Certa), sendo o livro distribuído em todas as bibliotecas das escolas da rede pública de ensino.
APROVADO!
"O Kelsen me ligou dizendo que o livro ia ser publicado e eu perguntei: que livro?"
Desacreditava Noélia, que nem ao menos sabia do esforço do amigo. Agora taí, a menina de Seu Joaquim e Dona Itelvina, ESCRITORA.
E me sinto na feliz responsabilidade de chamar atenção para o fato não apenas por ela, mas por todos os jovens envolvidos. Ainda que não resultasse na publicação de um livro, afinal ninguém é obrigado a se tornar escritor, artista, atleta e tal. Mas é claro que incentivar a garotada, oferecendo-lhe condições para desenvolver seus dons, nos pouparia em desgraça.
"Há tempos são os jovens que adoecem", cantava o Renato Russo.
Sou de me preocupar com o destino da "galera". Me dá um nó na garganta quando sei de uns tantos muito orgulhosamente alardeando que a auto-estima dos tamborilenses foi enfim restaurada por estes mega eventos que levantam a Saia Rodada, exibindo a Calcinha Preta dos Aviões do Forró. E por favor me escutem tal como digo, não mais do que digo. Não é que eu defenda que Seu Menino e Dona Menina e a meninada de plantão devessem se privar de festejos e até dos seus "birinaites". Imaginem!Também a mim apraz uma boa fuzarca. Mas pelo amor de Santo Anastácio, no dia que a "lapada na rachada" for a expressão maior da dignidade de minha gente, desisto de meu enterro no velho Tambas. Demos às coisas os nomes adequados.
Por falar em auto-estima...
A formação se dá por meios menos dispersivos. O conhecimento requer atenção. A sensibilidade se apura nas experiências mais sutis. Quando os dons são reconhecidos, estimulados, bem orientados e encontram meios pelos quais se expressar, é quando de fato temos realizações significativas.
E é por isto que desejo e cobro a continuidade do projeto que deu a Tamboril a alegria de ver a Noélia publicando. Como também desejo ver florescer muitas outras idéias e ações que explorem melhor o potencial das pessoas e lhes acrescente em dignidade.
Preservo a minha fé em cada um dos lá, porque perdê-la seria como desacreditar em mim mesma. Presto-lhes toda atenção e sofro as perdas e comemoro os ganhos. Verdadeiramente. De onde estiver.
Um abraço a todos, cheio de carinho, enquanto fico por aqui a Djavaniar:
"Feito mãe que dorme olhando os filhos, com os olhos na estrada."
CERONHA PONTES
Recife-PE, 16 de abril de 2010.