sábado, 30 de abril de 2011

Essa febre que não passa...

Foto: Rafael Escócio


Estréia na próxima sexta, 06 de maio o mais novo espetáculo do Coletivo Angu de Teatro, inspirado nos contos da escritora pernambucana Luce Pereira. Mulheres recolhendo a dor, contendo fogos. Tenho derramado lágrimas estranhas. Muitas.
Ter a personagem sob absoluto controle, a consciência clara do artifício que me leva a provocar esta ou aquela emoção no espectador. Representação pura: ilusão que eu persigo.
Nessa Febre, no entanto, é como se Luce Pereira "zombasse" de minhas pretensões e me tirasse do eixo sem piedade. São suas as histórias, mas vejo expostos na sua narrativa os escuros de mim mesma. Entro em cena frágil, com todo amor e atenção possíveis, porque do resto não sei mais. Alguma vez eu soube?


Ceronha Pontes
Recife-Pe, 30 de abril de 2011

domingo, 10 de abril de 2011

Recusa



Aos outros todos, de um jeito ou de outro, posso determinar a distância favorável. Contigo, pela natureza do que nos uniria, temi que não fosse possível. E se me roubasses toda esta coisa pouca que fiz de mim?


Ceronha Bisonha
Recife-pe, 10 de abril de 2011 

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Deus e o outro contra quem?



Há seis dias uma bactéria se alojou no meu estômago e fez um estrago tão grande que, agora sim, eu sei o que é doença. Não que o referido órgão tenha sempre funcionado direitinho, posto que, juntamente com a garganta tem me dado é trabalho de tempos em tempos. E o povo mais astral tem lá suas explicações para eu adoecer justo aqui e ali mas, desta vez, pelos deuses!, na boa, sem poesia.


 A bicha se apoderou de mim como poderia ser por qualquer pessoa, independente das inclinações, grau de sensibilidade, o caralho. Entrou, gostou, se instalou e me fez experimentar minha dor física maior em duração e intensidade, sem contar os outros sintomas. Queria me arrancar a vômitos de dentro de mim. E quase fui, amarelo-esverdeada e fedorenta. Dias de agonia na companhia nervosa do digníssimo, coitado, que num primeiro momento perdeu o controle com enfermeiros e seguranças do hospital para garantir que alguém trouxesse um médico AGORA! 


É impressionante a falta de interesse de quem, ironicamente, trabalha na URGÊNCIA. Lá se vem um doutorzinho com cara de garoto criado à base de danoninho, e que passou dois dias me sedando com uma gororoba na veia, sem um exame mais minucioso que indicasse o devido tratamento. Apalpava o bucho e aumentava a dose. Tou pra entender como foi que nos submetemos. A gente fica tudo doido na hora da aflição. Aliás, nesta primeira fase eu mesma dei o diagnóstico. Errado, é claro. Não tenho a obrigação. Aos prantos eu dizia: "Doutor Tiago, há dez anos eu tive uma dor no abdômen  e o gastro constatou que era verme". KKKKK!!! Pois o garoto comprou  a idéia e prescreveu cheio de autoridade a dose máxima de um conhecido remédio pra lombriga. Ainda bem que mal não faz. Mas é óbvio que foi o moço (tão moço!) me dar alta, eu chegar em casa já passando o efeito da "meisinha" que mascara a dor, e recomeçando um tormento que dura até agora, embora já bastante atenuado, com a graça de Santo Anastácio. É que depois de um fim de semana atirando no escuro, finalmente os exames devidos me puseram em confronto com o inimigo identificado, a quem vou vencendo devagar e sempre, com auxílio indispensável dos medicamentos adequados.


Não deixei de perceber o privilégio desde como e com quem me desloco de minha casa até um hospital particular, ostentando a carteirinha de um plano de saúde, com algum recurso que transforme este episódio em repertório muito em breve. O privilégio de ter um corpo bem nutrido, capaz de suportar adversidades assim e até comemorar os quilos perdidos na agonia (era reserva demais). O privilégio de ter algum conhecimento e voz. Vergonha. 


O que faz a maioria com uma dor descomunal daquelas? Vai pra onde? Se atraca nos colarinhos de quem? Compra de que jeito o alívio? Fosse com aquelas meninas "embuchadas" que limpam para-brisa de carro na esquina do referido hospital de nobre bairro recifense, talvez morressem ali no meio-fio e escorregassem direto pra dentro do canal que divide a avenida larga. Quem se daria conta? Me lembro de um dos textos maravilhosos da dramaturga cearense Susy Élida, o MEIRE LOVE. Tem uma passagem em que uma Meire de rua situa a outra: "mulher, tu lá tem quem puna por ti". 


A boa-samaritanice acentuada pela "quizira", me fez dar uma força pro Djair, a quem uma bactéria muito mais destruidora, adquirida num hospital através do manuseio de cateter, deixou seqüelas que não se deseja aos inimigos, quem os tenha. Depois do feito, mais vergonha. Adianta quanto? O digníssimo, agora sereno diante de meu "abuso" restabelecido, dispara o óbvio necessário: "não podemos deixar de fazer o que podemos só porque isto não resolve o problema todo ou de todos". 


"Ai dentro" que a mazela me botou mais moles o tico, o teco e o tum-tum. Deve ser porque antes de pedir socorro ao Santo Anastácio, gritei foi pelo Papai mesmo. Feito nas questões da adolescência: "meu pai, me ajuda!" Se ainda desencarnado, deve ter movido mundos.  A simples lembrança do cara (meu pai), traz naturalmente esta afobação rebelde marxista descontextualizada(?). O mártir, o pai e o pensador (e mais o Kardec, disfarçado no "desencarnado"), tudo num mesmo post, não deixa dúvida de que eu pelejo, minha gente. Ah, eu pelejo! E não sem vaidade (essa peste!), faço o meu e ainda acendo vela pra Deus e pra quem mais.
Saravá!


Ceronha Pontes
Recife-Pe, 07 de abril de 2011


P.S.: "Ai dentro" é uma expressão genuinamente cearense que serve pra todo tipo de mangação. Expliquei?